Memórias de um tímido. Ou de um fobista social


Sou tímido. E tenho fobia social. Branda, tenho alguma coisa que me faz sentir mais confortável quando volto para casa e fecho a porta atrás de mim. Porém, ao contrário de Luis Fernando Veríssimo, um tímido assumido, como o escritor de grande notoriedade reconhece em entrevistas em um texto publicado em 1995, tentei durante anos vencer a timidez. O investimento no esforço de corrigir a "falha de estrutura da personalidade" reflete o impulso natural diante da sociedade que cultua o mito do homem como ser social.

Timidez faz mal. 
Iniciei terapias umas três vezes. Achando que não estava sendo ouvido e sem dar conta de dizer que estava pouco satisfeito com o processo de análise, dei o calote em todos os que me atenderam, antes de abandonar os tratamentos -- há alguma dúvida de que não dar conta de dizer é um comportamento típico de um tímido?

Humanos com timidez, e mais ainda com fobia social, demonstram intensa ansiedade em situações de convívio com outros seres da mesma espécie. Segundo os especialistas, os temores, capazes de se transformar em pânico e visível no suor destilado por alguns dos fóbicos sociais, geram os surtos, em diferentes intensidades. As dificuldades transparecem em em situações específicas, em especial onde há, conscientemente ou não, o "perigo" da avaliação de outras pessoas.

Como bem assinalou Luis Fernando Veríssimo, o tímido é, na realidade, um narcisista enrustido, pois sente que todos prestam atenção nele. Se alguém realmente reparasse nos fóbicos sociais, como eles sempre acham que ocorre, iria perceber o olhar de inveja quando, na festa, chega o colega de trabalho e sai distribuindo simpatia e extroversão.

Eu, particularmente, confesso uma envergonhada inveja das pessoas que chegam em uma festa, evento ou mesmo no trabalho e distribuem abraços e beijinhos. Tenho uma sobrinha que certa vez confessou um pânico dos meus cumprimentos com dois beijinhos. "Eram socos com o rosto", brincou uma vez. 

Na vida de um fóbico social, até mesmo uma corriqueira reunião vira um suplício. Alguns sofrem antecipadamente com a dúvida sobre como proceder ao chegar: as mulheres devem ser cumprimentadas com o aperto de mãos ou com beijinhos? Um ou dois beijos. Um beijo e abraço no pescoço ou no rosto? Quem define as iniciativas?

Comentários

  1. Pode-se começar por pensar em representar o papel de alguém que não é tímido...

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